Músicos na Paulista
Um breve exercício antropológico
Research / Service Designer
Esse é um exercício despretensioso de jovens designers para entender um pouco mais sobre como ouvir as pessoas e dar a merecida atenção pode contribuir e muito para a criação de serviços que sejam cada vez mais relevantes para elas, colocando em prática alguns dos processos da pesquisa etnográfica.
Mas seria possível montar um trabalho
de pesquisa etnográfica em apenas 4 saídas a campo?
Alguns diriam que é impossível. Onde já se viu, tá louco!
E na literatura encontramos um tempo de pelo menos 3 meses!
É realmente muito mais tempo do que as 36h que tivemos de aulas e trabalhos, mas, assim como na realidade do mercado, poucos projetos terão esse tempo dedicado a uma pesquisa etnográfica.
O nosso trabalho de imersão em si durou apenas 4 dias, algo em torno de 16h,
o que foi suficiente para nos tirar da zona de conforto e nos aproximar um pouco mais das pessoas e quebrar alguns preconceitos.
Porque a antropologia é uma pesquisa que se constrói na interação com o grupo de indivíduos pesquisados, assim como o design.
Carol Zatorre, Antropóloga
Planejamento
Para nos organizarmos, otimizar o trabalho e evitar a dispersão durante o campo, seguimos o esquema: cenários, atores e regras.
A avenida Paulista foi o nosso cenário e lá encontramos os músicos, os atores que escolhemos, alguns estavam simplesmente divulgando o seu trabalho, enquanto outros lutavam para ganhar dinheiro para comprar comida.
Com essas definições fizemos uma pequena desk research e, logo em seguida, alinhamos o conhecimento do grupo com a clássica Matriz CSD.
Matriz CSD
Essa organização prévia foi importante para evitar o senso comum e ter desde as primeiras observações uma forma mais clara de organizar e classificar todo o material de campo.
A ideia da primeira ida a campo era apenas contemplar, estar livre para ser impactado pelos estímulos sensoriais ao longo de toda a caminhada, observando como tudo se comportava, prédios, pedestres, comércio, turistas, músicos e o que mais ali estivesse, sem entrevistar ninguém. E essa foi a parte mais complicada, pois em muitas vezes queríamos puxar uma conversa com as pessoas.
Campo
Com manchas definidas voltamos para o campo, mas dessa vez mudamos para uma abordagem mais ativa conversando diretamente com os nossos atores.
Por mais que tenhamos criado perguntas para as entrevistas, não nos apegamos a elas, seguimos a essência do roteiro, deixando mais livre para o entrevistado expor seus sentimentos, suas dores e necessidades, sem engessá-lo.
Essas conversas mais livres foram muito enriquecedoras e nos aproximaram mais dessas pessoas, nos permitiram descobrir cada história de vida fantástica, como a do seu Lindomar, um ex-alcoólatra que no meio da conversa declamou o poema que fez no dia que parou de beber.

Todas as nossas conversas foram em duplas e, ao final de cada uma, compartilhávamos no WhatsApp o áudio com o conteúdo que ainda estava fresco em nossas cabeças. Uma técnica muito boa para todos do grupo estarem alinhados.
Mas o que importa ao olhar antropológico não é apenas o reconhecimento e registro da diversidade cultural, nesse e em outros domínios das práticas culturais, e sim a busca do significado de tais comportamentos: são experiências humanas - de sociabilidade, de trabalho, de entretenimento, de religiosidade - e que só aparecem como exóticas, estranhas ou até mesmo perigosas quando seu significado é desconhecido. O processo de acercamento e descoberta desse significado pode ser trabalhoso, mas o resultado é enriquecedor: permite conhecer e participar de uma experiência nova, compartilhando-a com aqueles que a vivem como se fosse "natural", posto que se trata de sua cultura.
José Guilherme Cantor Magnani, Antropólog0
Resultado
Depois de aproximadamente 14h de campo, conseguimos ouvir 9 pessoas, entre jovens, idosos, alcoólatras, equatorianos e até uma orquestra de violas caipiras. Consolidamos todo esse material em user boards, personas, principais aprendizados e 4 direcionamentos para ações que poderiam ser criados para essas pessoas.